Uma Uma Família Feliz – Raphael Montes

Atenção: este texto contém spoilers! Se você ainda não leu o livro e não quer estragar a surpresa, recomendo voltar depois da leitura.  ☺️

Eva parece ter uma vida perfeita: mora em um belo condomínio em uma área nobre do Rio de Janeiro, é bonita, trabalha com o que gosta e se destaca profissionalmente. Cuida com carinho das duas enteadas e é casada com um homem dedicado à família. Um retrato clássico da família ideal. Perfeito, ou quase.

Então Eva fica grávida. Ela fica insegura, mas frente a felicidade de todos e principalmente do marido que quer muito ter um filho, varre o medo para baixo do tapete. E assim, tudo que era perfeito começa a ruir.

O que eu achei da história

Percebi uma evolução na escrita do autor. Apesar de admirar seu trabalho e ser fã do gênero, alguns aspectos me incomodaram nesta obra.

Essa é uma história que se apoia muito no suspense, em que é o culpado por ferir as crianças, o livro até dá pistas. A pista mais evidente, para mim, está no local dos ferimentos — talvez porque, na minha leitura, eu já soubesse quem era o responsável. Ainda assim, não achei que o livro estivesse repleto de indícios.

E o livro chega ao fim revelando tudo num ponto que acredito ecoa o filme a Órfã. Não é a primeira vez que leio ou vejo obras com crianças psicopatas, inclusive já vi matérias de casos reais que são verdadeiramente chocantes. Acredito que essa revelação tenha chocado muitos leitores. Mas, para mim, por mais estranho que pareça, ela acabou diminuindo o impacto do terror.

Toda a história é narrada sob a perspectiva de Eva. Acompanhamos seu cotidiano, as pressões para manter tudo impecável, as dores do passado e a relação difícil com a mãe. Então a história e os personagens nos guiam para duvidar dela, e sugerindo que talvez esteja enfrentando um quadro severo de psicose pós-parto — que não deve ser confundida com a depressão pós-parto — e que por isso não lembra o que faz, tem delírios, o que poderia justificar comportamentos violentos e de risco para ela e o bebê. Pessoalmente, acredito que, se o livro tivesse seguido por esse caminho, o resultado teria sido ainda mais perturbador.

Imagine não ter controle e não saber o que faz, e que isso faz com que você ponha em risco a sua família e seus filhos. É o pesadelo de qualquer mãe.

E essa história é sobre a Eva. Então no final a culpada acaba sendo pouco explorada. Preferia que o autor abrisse mão de ter um plot twist no final que deve surpreender a todos, para que Ângela fosse mais explorada.

Paraíso, Eva e o pecado

Esse livro traz muitas associações com a Bíblia.
O Blue Paradise era a versão de paraíso da Eva: longe do bairro pobre onde cresceu, dos abusos da mãe, de um passado considerado “sujo”. Ali, tudo era organizado, impecável — como um comercial.

Qual foi o pecado dessa Eva? Ser mãe? Querer sair da pobreza e conquistar o paraíso? Talvez tudo isso junto. Pelo nome da personagem, pelo desfecho da história e pelo julgamento do marido e vizinhos, ela é tratada como a pecadora.

Há também um paralelo com Caim e Abel.

Em geral, gostei da leitura — é um gênero que sempre me atrai.

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